Empreendedorismo

Menos mãos sujas com tinta e mais pés cheios de lama

Por que a inovação precisa voltar do quadro para a prática

Vivemos uma era em que a inovação virou um quadro bonito pendurado na parede cheio de cores, post-its e jargões. Mas sejamos honestos: o que transforma o mundo não é o que fica no papel, e sim o que encosta no barro. Menos mãos sujas com tinta e mais pés cheios de lama. Porque o verdadeiro progresso nasce do contato com a realidade não da contemplação do conceito.

Hoje, é quase um pecado dizer que o problema não está na falta de ideias. Vivemos um excesso de diagnósticos, manifestos e metodologias. Mas se ideias realmente bastassem, o mundo já seria um lugar melhor. O que falta não é pensar diferente é executar diferente. 

A armadilha do discurso

Empresas, governos e startups vivem num looping de apresentações, metodologias e discursos. Todo mundo fala de design thinking, agilidade e propósito, mas pouca gente mede o resultado real: o que ficou de pé, o que foi entregue, o que gerou valor. 

O Gartner aponta que 72% dos projetos de transformação digital falham em capturar valor. Não é tecnologia o problema ̶é abstração demais. Falta barro. Sobra tinta.

Essa “indústria da inovação” virou um mercado bilionário de consultorias, frameworks e cursos. Mas o verdadeiro diferencial competitivo está em quem tem coragem de implementar o simples.

O chão ainda é o maior laboratório

Valor nasce onde há atrito. Onde o sapato afunda. É lá, no barro, que a teoria encontra a vida real. Quem nunca saiu do ar-condicionado pra entender como a operação funciona, não tem a menor ideia do que precisa mudar.

E o alerta é global: mais de 40% dos projetos de IA agêntica serão cancelados até o fim de 2027, segundo o Gartner. Motivo? Custos crescentes, falta de clareza no retorno e o fenômeno em alta o “agent washing”: soluções comuns travestidas de inteligência artificial, vendidas como revolução e entregando o mesmo de sempre. Ou seja, mais tinta, menos lama. A inovação sem chão virou espetáculo. Mas inovação de palco não paga folha, não muda cultura e não sustenta empresa. A boa inovação é invisível: aquela que funciona, reduz custo, melhora experiência e entrega resultado.

O abismo entre ideia e execução

Hoje, menos de 1 em cada 8 iniciativas de transformação digital entrega valor real, e apenas 19% das organizações afirmam ter investido de fato em IA agêntica até 2025. O problema não é técnico é cultural. Falta coragem pra abandonar o palco e encarar o chão. É ali que as ideias se provam, que a inovação deixa de ser PowerPoint e vira resultado. Quer mudar o jogo? Pare de pintar o futuro e comece a pisar nele. Liderança de verdade se mistura com o time, encara o desconforto e aprende com o atrito. É no barro que as boas ideias se sujam o bastante pra virarem soluções de verdade. 

O Brasil e o retrato da inovação

No Índice Global de Inovação 2025, o Brasil aparece em 52º lugar entre 139 países, duas posições abaixo do ano anterior. Na América Latina, perdemos a liderança para o Chile. Entre as economias de renda média-alta, estamos em 5º, atrás de China, Malásia, Turquia e Tailândia. Temos força em pesquisa e desenvolvimento ̶ subimos dez posições nesse quesito, chegando à 26ª colocação global. Mas seguimos fracos nos insumos que sustentam a inovação (63º lugar). Traduzindo: sabemos pintar bons quadros, mas ainda não aprendemos a andar na lama.

O recado é simples

Inovar é bonito. Executar é transformador. Chega de palco, chega de tinta, chega de discurso. O futuro não será desenhado em post-its será moldado por quem ainda tem coragem de sujar os pés, testar, errar e acertar. O que separa uma empresa inovadora de uma que apenas fala sobre inovação é simples: ação com propósito, não teoria com glamour. 

“Menos estética, mais entrega. Menos discurso, mais chão. Porque o amanhã não vai esperar e o futuro não nasce limpo.”

Da teoria à transformação

O Brasil precisa parar de confundir ideia boa com ideia que dá certo. Ideia boa é aquela que sobrevive ao campo, à operação, à realidade. Não é sobre “inovar por inovar”. É sobre gerar impacto concreto, mensurável e sustentável. A tecnologia é o meio. Mas o resultado é e sempre será humano. E enquanto muitos continuam pintando o futuro com tintas vibrantes, poucos se lembram de que é na lama que ele realmente começa a tomar forma.

Referências

Gartner, OMPI ‒ Índice Global de Inovação 2025, Forbes Brasil, TELETIME, Administradores, Mobil Industrial, StartSe, Forbes Tech, Exame.

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Fernando Santos

Fernando Santos é vice-presidente de articulação presidente, CEO e Founder da System Service, líder de desenvolvimento tecnológico na Abrasel e Presidente no Brasil Digital para Todos Ecosis MG. Empreendedor apaixonado por tecnologia, ajuda as pessoas no processo de maximização de seus negócios por meio da transformação digital. Está à frente de projetos de letramento e inclusão digital.

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