O ciclo vicioso da inovação fake: o teatro destrói a essência
A inovação fake virou um personagem recorrente nas empresas que falam em futuro, mas continuam presas a velhos hábitos. Em muitas organizações, a palavra inovação aparece em discursos, murais, relatórios e reuniões de liderança. Entretanto, quando olhamos com calma para o que realmente muda na prática, percebemos um descompasso perigoso entre narrativa e realidade. Assim, nasce o teatro da modernidade: tudo parece avançado por fora, porém quase nada se transforma por dentro.
A ilusão começa pela estética. Slides impecáveis, apresentações envolventes e protótipos visualmente sofisticados criam a sensação de progresso. Além disso, termos em inglês, gráficos coloridos e jargões técnicos reforçam a impressão de que algo grandioso está em curso. No entanto, basta observar os processos do dia a dia para notar que muita coisa permanece igual. Essa inovação de fachada se alimenta exatamente dessa distância entre o que é dito e o que é feito.
A expressão inovação fake descreve iniciativas que parecem revolucionárias, mas não alteram processos, modelos de negócio ou resultados concretos. Em outras palavras, é inovação que vive em apresentações, protótipos e comunicados internos, porém não chega à operação. Esse fenômeno ganhou força porque o ambiente corporativo valoriza quem fala bonito sobre futuro, mesmo quando o presente continua desorganizado.
O chamado teatro da inovação surge quando a empresa investe mais em demonstrar inovação do que em construí-la de verdade. Hackathons, squads, laboratórios modernos e métodos cheios de post-its podem ser úteis, mas, em muitos casos, viram apenas cenário. Ainda assim, eles seduzem porque dão visibilidade rápida para líderes e áreas que desejam parecer estratégicos. Dessa forma, a energia se concentra em manter o palco aceso, e não em gerar impacto real.
A estética também ajuda a empurrar o problema para frente. Um protótipo bem-feito produz encantamento imediato. Além disso, storytelling sofisticado faz qualquer ideia parecer madura, mesmo quando está em estágio inicial. Pesquisas mostram que executivos costumam superestimar o grau de prontidão de projetos apresentados em formato de protótipo. A beleza visual, portanto, anestesia a análise crítica e encoraja decisões pouco realistas.
O ciclo da inovação fake costuma seguir três movimentos previsíveis, que se repetem projeto após projeto. Em primeiro lugar, surge a fase da grandiosidade inicial. Alguém apresenta uma visão ambiciosa, cheia de buzzwords e promessas de transformação. Assim, o escopo já nasce inflado, com inteligência artificial, automações complexas, integrações externas e reengenharia de processos em um único pacote. Quanto mais sofisticado o discurso, maior o descompasso com os recursos disponíveis.
Em seguida, entra em cena a política interna. Essa inovação de fachada serve para inflar reputações, fortalecer áreas específicas e justificar orçamentos. Além disso, ela prospera em ambientes onde poucas pessoas entendem de tecnologia em profundidade. Quando decisões são tomadas com base em aparência, e não em impacto mensurável, o teatro se torna ainda mais confortável. Questionar o espetáculo passa a ser visto como resistência ao futuro, e muitos preferem se calar.
Por fim, chega a fase da implosão inevitável. O projeto encontra engenharia, dados reais, operação e orçamento. Dessa forma, limitações técnicas, falhas de integração, ausência de governança e problemas de qualidade derrubam as promessas iniciais. Em vários casos, as iniciativas são reduzidas, adiadas ou simplesmente abandonadas. O que resta é uma combinação de cansaço, cinismo e descrédito em relação à próxima grande ideia anunciada.
No Brasil, é possível observar empresas que aprenderam com esse ciclo e ajustaram a rota. Um exemplo é o da Magazine Luiza, que se tornou referência em digitalização, mas também enfrentou o risco da grandiosidade excessiva em projetos de inteligência artificial. Inicialmente, o escopo previa integrações complexas com sistemas legados e personalização em larga escala. No entanto, a empresa decidiu reduzir o projeto para um piloto mais simples, testar hipóteses e só depois escalar. Assim, diminuiu o desperdício de recursos e aumentou o aprendizado real.
Outro caso interessante é o do Banco Inter em sua jornada para se posicionar como super app. Em determinado momento, a empresa lançou várias funcionalidades ao mesmo tempo, buscando ocupar diferentes espaços da vida do cliente. Algumas dessas funções, porém, não tiveram a adesão esperada e consumiram recursos importantes. A correção de rota veio com foco radical: priorizar serviços financeiros essenciais, fortalecer a base e evoluir gradualmente. Com isso, o app se tornou mais robusto, apoiado em entregas consistentes, e não apenas em promessas.
Esses dois exemplos revelam um ponto em comum. Inovação real não é fogos de artifício, mas disciplina. Ela exige recorte, priorização, escolha consciente do que não será feito agora. Além disso, demanda coragem para admitir que certas ideias, embora bonitas, não cabem na realidade atual da empresa. Quando essa maturidade aparece, o teatro da inovação perde força e dá lugar a decisões mais responsáveis.
O teatro da inovação não é inofensivo. Projetos mal planejados podem consumir fatias significativas do orçamento anual de tecnologia sem gerar retorno concreto. Além do dinheiro, há também o desgaste emocional das equipes. Pessoas são mobilizadas, trabalham noites e fins de semana em iniciativas que, no fim, não saem do lugar. Assim, instala-se a sensação de que a empresa faz muito barulho, porém entrega pouco.
Culturalmente, isso produz um efeito corrosivo. Times passam a encarar qualquer nova iniciativa com desconfiança. Líderes perdem credibilidade quando anunciam mais um grande programa sem explicar o que foi aprendido com os anteriores. Além disso, a organização entra em um paradoxo curioso: quanto mais projetos falham, mais a empresa lança novas iniciativas para tentar compensar as frustrações anteriores. O resultado é um ciclo vicioso de energia desperdiçada.
Esse ambiente ainda reforça comportamentos defensivos. Em vez de admitir erros e ajustar rotas com transparência, muitos preferem maquiar resultados ou empurrar problemas para o futuro. Dessa forma, essa inovação de fachada se perpetua como uma espécie de autoengano sofisticado. Tudo parece moderno nos relatórios, mas o cliente quase não sente diferença na experiência real.
Sair desse ciclo exige escolhas difíceis. O primeiro passo é praticar o que alguns chamam de brutalidade intelectual. Isso significa questionar cada premissa com rigor, antes de investir tempo e dinheiro. Qual problema real estamos resolvendo? Quem sofre com esse problema hoje? O que acontece se não fizermos nada? Se essas respostas não forem claras, talvez o projeto ainda seja apenas uma boa ideia de palco.
O segundo passo é adotar foco radical. Em vez de começar grande, a empresa escolhe começar pequeno, com pilotos bem definidos, escopo enxuto e métricas claras. Além disso, testa hipóteses rapidamente e só escala quando há evidências de impacto real. Essa abordagem reduz riscos, aumenta o aprendizado e protege o orçamento. Em muitos casos, ela mostra que uma solução simples resolve mais do que um grande programa de transformação.
O terceiro passo é cultivar humildade estratégica. Nem toda ideia brilhante cabe na realidade atual da empresa, e tudo bem. Inovação não é sobre glamour, mas sobre impacto sustentável. Aceitar limites não significa falta de ambição; significa responsabilidade. Quando líderes admitem que não é possível abraçar tudo ao mesmo tempo, a organização ganha foco e aumenta as chances de entregar o que realmente importa.
Inovação fake é a arte de começar grande e terminar em lugar nenhum. Ela se alimenta de apresentações impecáveis e promessas genéricas, mas evita o contato direto com a operação. Inovação real, por outro lado, é a disciplina de começar pequeno e terminar entregue. Ela se ancora em problemas concretos, indicadores claros e aprendizado contínuo.
O desafio central não está em criar ideias, porque ideias são abundantes. O verdadeiro desafio é transformar essas ideias em resultados consistentes para clientes, equipes e acionistas. Para isso, é preciso menos espetáculo e mais execução. Quando a empresa abandona o teatro da modernidade e encara a realidade com honestidade, a inovação deixa de ser um slogan vazio e volta a ser o que sempre foi em sua essência: a capacidade de mudar o que importa, de forma responsável e sustentável.
Menos teatro e mais execução.
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